Quando
o câncer é recorrente na família, está mais do que justificada a
angústia de rastreá-lo com rigor e frequência, a fim de se resguardar de
um perigo iminente. "Mutações em genes supressores de tumor, como o
BRCA1 e o BRCA2, elevam em até 60% o risco de desenvolver o problema no
decorrer da vida", alerta o ginecologista Afonso Nazário, da
Universidade Federal de São Paulo.
Mas paira a dúvida: entre as mulheres que nunca conviveram com o tumor
em casa, quantas se dedicam com afinco a proteger suas mamas? Nosso
recado de prevenção é especialmente dedicado a esse nicho feminino, que
muitas vezes nem se dá conta da ameaça. "Em oito de cada dez casos — ou
seja, a maioria absoluta —, o tumor é o que chamamos de esporádico, ou
seja, não tem relação alguma com antecedentes familiares", alerta o
oncologista Ronaldo Corrêa, do Instituto Nacional de Câncer, no Rio de Janeiro.
Já
que o destino das glândulas depende, principalmente, dos hábitos de
todo dia, cientistas mundo afora se esforçam para desvendar quais deles
induzem e quais dificultam a eclosão da enfermidade. Começam a surgir
revelações surpreendentes: a vitamina D, das castanhas e dos peixes,
produzida pra valer quando tomamos sol, teria efeito protetor contra o
câncer mamário. A descoberta é do epidemiologista francês Pierre Engel,
do Instituto Gustave Roussy, que, durante uma década, analisou dados
referentes a mais de 67 mil mulheres. "A forma ativa da vitamina, o
calcitriol, regula o ciclo das células da mama, inibindo sua
proliferação desordenada", explica Engel a SAÚDE!.
Não
à toa, a probabilidade de manifestar o nódulo maligno foi 32% menor em
quem aliava o consumo do nutriente a banhos de sol regulares. Fica a
dica: sair ao ar livre com braços e pernas descobertos por 15 minutos
diariamente. Mas essa é apenas uma sugestão de uma lista de atitudes
preventivas. O combate à barriga volumosa merece destaque, por seu
potencial de destrambelhar as glândulas mamárias. "A adesão ao pacote de
exercícios, alimentação balanceada e controle de peso já reduz em 28% o
risco de câncer de mama", garante Corrêa.
Se
fosse necessário apontar um culpado pelos tumores de mama, certamente a
dupla de hormônios femininos estrogênio e progesterona estaria no banco
dos réus. "Essas substâncias agem nos receptores das células mamárias,
induzindo sua proliferação", explica Nazário. Obviamente, quanto maior o
estímulo, maior a oportunidade para que essas unidades comecem a se
multiplicar indiscriminadamente. Esse raciocínio explica por que as
mudanças no planejamento familiar ao longo dos anos colaboraram com o
aumento paulatino na incidência do tumor. "Devido à conquista do mercado
de trabalho, a mulher de hoje decidiu diminuir a prole e deixou para
engravidar em idade mais avançada", reflete Nazário. Isso faz com que
ela tenha mais ciclos menstruais durante a vida, ampliando a exposição
hormonal. Pelo mesmo motivo, a menarca precoce e a menopausa tardia,
após os 50 anos, entram no rol dos fatores de risco.
Mas,
se é inviável controlar esses aspectos socioculturais e biológicos, o
jeito é incentivar a reversão de costumes negativos e o investimento nos
positivos. A intenção segue a mesma: reduzir o aporte de hormônios nas
glândulas e manter o funcionamento dos genes em equilíbrio, garantindo
que as células se repliquem em harmonia.
TRATAMENTOS HORMONAIS
A
pílula anticoncepcional não é motivo de preocupação, já que as
formulações atuais são de baixa dosagem e seguras. "Mas, embora em
quantidades ínfimas, o hormônio sintético é 200 vezes mais potente que o
natural", ressalva Nazário. Mesmo assim, a restrição de uso só se
aplica a mulheres com forte histórico familiar de câncer de mama ou com
mutações de BRCA1 e 2 diagnosticadas. Discuta com seu ginecologista. Com
a terapia de reposição hormonal — prescrita para atenuar sintomas da
menopausa —, a situação muda de figura. "Existem evidências de que, após
cinco anos de uso, os riscos de desenvolver o tumor de mama aumentam
significativamente", alerta a mastologista Maria do Socorro Maciel, do
Hospital A.C. Camargo, em São Paulo. "Por isso, o medicamento só é
indicado para alívio de sintomas e com rigoroso acompanhamento médico",
completa.
OBESIDADE
Eis
uma inimiga em potencial, sobretudo após a menopausa. Quando a mulher
deixa de menstruar e, portanto, encerra a fabricação de estrogênio, ele
para de atuar de forma nociva nas mamas. É aí que a gordura periférica
das obesas entra em cena para bagunçar o organismo. "Nessa fase, uma
enzima da glândula suprarrenal, a aromatase, inicia sua atuação,
convertendo a gordura em hormônio, que passa a ter atividade estrogênica
no tecido mamário", esclarece a mastologista Maira Caleffi, do Hospital
Moinhos de Vento, em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul. Em outras
palavras, o inconveniente ganha prorrogação por tempo indefinido, até
que a iniciativa de enxugar a silhueta ganhe contornos reais.
SEDENTARISMO
Para
início de conversa, ficar parado dá uma força ao acúmulo de quilos
extras. Esse, por si só, é um bom argumento para mexer o corpo. Sem
falar nos benefícios indiretos do exercício. "A atividade física diminui
o colesterol, matériaprima para a produção de estrogênio", afirma o
bioquímico Roberto Burini, do Centro de Metabolismo em Exercício e
Nutrição da Universidade Estadual Paulista, em Botucatu, interior de São
Paulo. "A ginástica também fortalece soldados do sistema de defesa chamados
natural killers, uma proteção natural contra células defeituosas",
acrescenta Maira. Vale a recomendação de sempre: 30 minutos de
exercícios aeróbicos moderados, de três a cinco vezes por semana.
ABRIR MÃO DE AMAMENTAR
Outro
equívoco de quem prioriza a saúde. Além de proporcionar um bem danado
ao recém-nascido, "o aleitamento durante seis meses promove uma
esfoliação interna das células da mama, renovação que favorece a
eliminação de eventuais unidades precursoras de tumor", justifica o
nutricionista Fabio Gomes, do Instituto Nacional de Câncer.
CONSUMO DE ÁLCOOL
"Existem
inúmeros estudos que correlacionam a ingestão de bebidas alcoólicas à
doença", diz Maira. "Ultrapassar três drinques semanais já é considerado
arriscado, segundo as evidências", avisa. Nem é preciso falar que a
situação só piora com o aumento dos goles.
ALIMENTAÇÃO
Ainda
não existe consenso em relação a alimentos que exerçam influência
direta na prevenção ou na ocorrência do câncer de mama. "Mas, em geral,
frutas, legumes e verduras contêm substâncias antioxidantes, que ajudam a
combater os radicais livres", lembra Fabio Gomes. Ele se refere a
moléculas que se formam naturalmente no organismo e que dão um
empurrãozinho para o aparecimento de tumores. Além disso, o
nutricionista ressalta que itens muito calóricos, como os cheios de
açúcar e gordura, estão por trás da temida obesidade. "Uma alimentação
inadequada também instiga a resistência à insulina, condição que estaria
associada ao câncer, embora não saibamos ainda o mecanismo que explique
essa relação", conclui Maria do Socorro. Por isso, a tão preconizada
alimentação balanceada é mais uma vez bem-vinda.
ESTRESSE, DEPRESSÃO E ANSIEDADE
Além
de contribuir com uma alimentação desregrada e diminuir o pique para a
atividade física, os especialistas já sabem que o abalo emocional é
capaz de detonar o sistema imunológico. "Daí que as unidades de defesa
perdem sua habilidade de reparar células que sofreram mutação, abrindo a
guarda para sua multiplicação anormal e o nascimento de um tumor",
explica Nazário.
DNA EM PANE. O QUE FAZER?
E
quanto àquele grupo que herda as mutações genéticas, será que há luz no
fi m do túnel para essa gente também? A resposta é sim. "Mulheres que
apresentam casos múltiplos de câncer de ovário ou de mama entre
familiares tendem a apresentar mutações de BRCA1 e 2", diz Nazário.
Nessa situação, é prudente recorrer a um aconselhamento genético.
Trata-se de um exame capaz de apontar esses defeitos, que significam uma
grande propensão de manifestar o nódulo. Depois de conversar com a
paciente sobre suas intenções de engravidar, o médico costuma oferecer
três alternativas. "A retirada dos ovários promove uma redução de 50% no
risco de apresentar o tumor de mama. Já a remoção preventiva das
glândulas mamárias aumenta essa proteção para 90%", afirma o
ginecologista. Existe, ainda, a opção de preservar os ovários e as
mamas, contanto que a mulher se submeta a um acompanhamento semestral
criterioso (confira as orientações na tabela à esquerda).
DETECÇÃO PRECOCE
Não
importa se você integra a ala feminina majoritária, que só precisa
andar na linha para escapar do problema, ou se carrega no DNA uma
vulnerabilidade que exige mais cautela. A orientação para todas as
mulheres é a mesma, e se resume a duas palavras: prevenção e atenção.
Assim, mesmo se todo o seu esforço em viver de maneira saudável falhar, o
diagnóstico prematuro do câncer garantirá um tratamento sem grandes
traumas e consequências. Em nome da qualidade de vida e da autoestima,
essa é uma precaução que não pode faltar.
UM TUMOR EM ASCENSÃO
Mudanças
no comportamento reprodutivo e nos hábitos femininos coincidiram com o
aumento da prevalência do câncer de mama no Brasil nas últimas décadas.
"Dados de Goiânia, em Goiás, que foram coletados entre 1980 e 2010 e são
considerados referência no país, revelam um crescimento de 200 a 300%
na incidência da doença nesse período", divulga Afonso Nazário. Embora
seja difícil apontar com precisão os responsáveis pelo crescimento
espantoso da doença, é indiscutível que, ao longo dos anos, as mulheres
passaram a ter menos filhos e a engravidar mais tardiamente, o que
favorece o mal (veja a explicação na página seguinte). "O estresse, a
depressão e a obesidade também estão entre os percalços do cotidiano
moderno associados ao descompasso celular", ressalta Nazário.
ANÁLISE DE RISCO
O rastreamento do tumor de mama deve se intensificar de acordo com a probabilidade de ele dar as caras
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Sem histórico na família: a mulher deve se submeter a uma mamografia
por ano a partir dos 40, já que 97% dos casos nesse grupo surgem após
essa idade.
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Com um episódio familiar: quem tem uma tia diagnosticada com um câncer
de mama, por exemplo, não necessariamente vive na iminência de herdar
alterações genéticas. Mas, pelo sim, pelo não, é indispensável antecipar
a primeira mamografia para os 35 anos e seguir com o acompanhamento
anual.
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Com mutação nos genes BRCA1 e 2 diagnosticada: essas pessoas requerem
vigilância reforçada. A palpação no consultório deve ser realizada com
um intervalo menor, a cada seis meses. Já o rastreamento anual é feito
por meio de ressonância magnética, que, extremamente sensível, é capaz
de detectar modificações mínimas, imperceptíveis em outros aparelhos.
Fonte: saude.abril.com.br
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