domingo, 16 de junho de 2013

O mais antigo animal domesticado pelo ser humano é o cachorro. Faz uns 100 mil anos que nossa espécie conta com a companhia e a lealdade do bicho, seja para se divertir, seja para ganhar apoio em algumas tarefas e se proteger. Passados milênios, a ciência prova que o homem tem ainda muito o que desfrutar dessa parceria — até indiretamente. Maior exemplo disso é a invenção do engenheiro químico Hossam Haick, do Instituto de Tecnologia de Israel. Ele se baseou na impressionante capacidade de faro dos cães para criar um aparelho capaz de detectar doenças pelo hálito. Em seu mais recente estudo, feito em parceria com pesquisadores chineses, Haick descobriu que seu "bafômetro" pode revelar um câncer de estômago com apenas algumas sopradas. 

"Nosso teste detecta um grupo específico de moléculas voláteis presentes no hálito", resume o israelense. Essas substâncias, digase, são muito delicadas e evaporam facilmente. "Todas as células do corpo, saudáveis ou cancerosas, emitem diferentes partículas para o sangue", ensina o cientista. O desafio, pensando em métodos de diagnóstico, está em criar maneiras de identificá-las e usá-las como boas pistas de que algo não vai bem. 

Na investigação sobre os tumores estomacais, os autores testaram o equipamento em 130 pessoas que se queixavam de algum desconforto gástrico, como dores, sensação de queimação ou azia constante. Certeiro, o exame chegou a diferenciar uma simples gastrite de um câncer com 90% de precisão. A ideia, agora, é avaliar a tecnologia em mais gente para assegurar sua eficácia. 

A novidade ganha importância pela dificuldade de flagrar precocemente o câncer de estômago — no Brasil, o diagnóstico tardio ocorre em três a cada quatro casos. Para detectar tumores ali, os médicos recorrem a endoscopias e biópsias, métodos caros e invasivos. "A estratégia desses novos aparelhos é limitar o grupo que vai precisar mesmo de endoscopia, exame complexo do ponto de vista da saúde pública", analisa o cirurgião oncológico Heber Salvador, do Hospital A.C. Camargo, em São Paulo. 

Enquanto os estrangeiros buscam formas mais ligeiras e econômicas de detectar tumores, cientistas brasileiros investem em aparelhos para checar se o coração está ok. Foi o caso da parceria entre o Instituto de Química da Universidade de São Paulo (USP) e o Instituto do Coração (InCor). Tudo começou quando o cardiologista Fernando Bacal, coordenador do Núcleo de Transplante Cardíaco do InCor, observou um hálito bem característico em pacientes com insuficiência cardíaca avançada, doença que enfraquece o coração e causa uma série de complicações — de falta de ar a comprometimento renal. "Em minha experiência, notei que essas pessoas exalavam um cheiro específico de acetona", conta o médico. 

A partir daí, ele procurou os químicos da USP, que aceitaram o desafio de conceber um aparelho com a capacidade de apontar, por meio do hálito, descompensações no músculo cardíaco. "Nosso trabalho foi criar um dispositivo fácil de manusear, que pudesse ser levado a campo sem precisar de muitos recursos", relata o químico Guilherme Lopes Batista, um dos autores do protótipo. 

A invenção brasileira, feita com materiais bem simples, como pedras porosas utilizadas em aquários ornamentais, exige que o paciente assopre o bocal de um recipiente de vidro até inflar um saco plástico. O material é levado para o laboratório. A água, que preenche o fundo do vasilhame, passa por uma análise. A presença de acetona, sinal de insuficiência cardíaca, é detectada nesse momento. "Para conseguir funcionar, o coração doente quebra alguns ácidos graxos a fim de obter energia, processo que libera acetona para a circulação", explica Bacal. 

Apesar de ainda estar sob estudo, a ideia dos especialistas é criar versões comerciais num futuro próximo. "Estamos buscando parcerias para viabilizar a produção de dispositivos que poderão ser utilizados em consultórios e até em casa", conta Batista. 

Já que falamos em usar o que escapa da boca como dedo-duro de apuros no peito, convém lembrar que a falta de cuidados na limpeza de dentes, língua e gengiva também coloca a saúde cardiovascular em risco. "Com a proliferação de bactérias na cavidade bucal, elas podem escapar de lá e chegar ao músculo cardíaco", diz o cardiologista Abrão Cury, do Hospital do Coração, em São Paulo. Essa invasão causa a endocardite, infecção severa capaz de levar o órgão à falência.


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